segunda-feira, 1 de julho de 2013

Nesta segunda-feira, o russo que revolucionou o futebol inglês completou uma década

Real Madrid e Manchester United se enfrentavam em Old Trafford, e Ronaldo e David Beckham, que marcaram cinco gols na partida entre eles, dividiriam todas as manchetes do dia. Mas algo muito mais importante do que a incrível vitória do Real Madrid pela Champions League acontecia naquela noite. Nas arquibancadas, a impressionante atmosfera do estádio e o espetáculo em campo cativaram alguém que estava, pela primeira vez, assistindo a uma partida de futebol ao vivo. E ele tomaria uma decisão, naquele momento, que mudaria a cara do futebol inglês.

O homem era Roman Abramovich. O bilionário russo, que estava acompanhado do amigo Avram Grant, deixou o Teatro dos Sonhos com uma ideia na cabeça: precisava comprar um clube de futebol. Depois de estudar a possibilidade de adquirir o Tottenham e o Fulham, optou pelo Chelsea, que ele comprou por tímidos 140 milhões de libras. O resto é história.

Os dez técnicos de Abramovich
Claudio Ranieri (2000-04)
José Mourinho (2004-07)
Avram Grant (2007-08)
Luiz Felipe Scolari (2008-09)
Guus Hiddink (2009)
Carlo Ancelotti (2009-11)
André Villas-Boas (2011-12)
Roberto Di Matteo (2012)
Rafael Benítez (2012-13)
José Mourinho (2013)
Nesta segunda-feira, Roman Abramovich completou dez anos de Chelsea. Em todo este tempo, ele concedeu apenas uma entrevista. Silencioso, ele causou um enorme barulho na Inglaterra com seu estilo agressivo e pouco 'democrático' de fazer negócios. Abramovich quer, Abramovich consegue. Esta é a história dos últimos dez anos nos Blues. A sala de troféus do clube, por exemplo, jamais havia sido tão frequentada como na última década. Os barulhos da prataria sendo mexida para lá e para cá se tornou algo comum desde que ele chegou, já que em todo fim de temporada é preciso encontrar espaço para mais taças e medalhas.

Em dez anos, foram mais de 700 milhões de libras investidas somente em contratações. Muitos erros foram cometidos, mas o bolso sem fundo de Abramovich significa que o Chelsea não perdeu tempo se lamentando por dinheiro jogador fora e simplesmente partiu para a próxima. A gastança desenfreada, classificada por Arsene Wenger como 'doping financeiro', conquistou a antipatia de muitos, mas também muito sucesso, e, sem sombra de dúvidas, foi o catalizador de uma revolução no futebol inglês. O Chelsea passou de um clube médio a um dos maiores papa-títulos do país. Na última listagem dos maiores clubes do mundo, eles apareceram em quinto lugar, à frente de equipes que, historicamente, sempre foram camisas de peso, como Liverpool, Arsenal, Milan e Juventus.

Frank Arnesen, que foi chefe do departamento de estatísticas e diretor das categorias de base do clube por seis anos sob o comando de Abramovich, em entrevista à BBC, descreveu o chefe como alguém que se preocupa com o desenvolvimento de novos talentos, quer ver seu time jogando um futebol atraente e considera todas as suas decisões profundamente antes de chegar a uma conclusão.

A imagem descrita por Arnesen contradiz tudo aquilo que se vê de Abramovich pelo lado de fora. Um homem teimoso, com uma determinação que beira a intolerância por vezes e, principalmente, muito impaciente. Que o digam os dez técnicos que ele contratou - e demitiu - em dez anos, algo incomum no futebol inglês.

José Mourinho, que assume o time novamente este ano, está em sua segunda passagem. Mesmo o 'Special One', primeira contratação de Abramovich para o comando do time e que colocou o novo Chelsea nos eixos conquistando duas vezes seguidas a Premier League - algo inédito na história do clube até então - não resistiu à ira do russo. Abramovich se cansou dos ataques de estrelismo do português, do seu estilo de jogo e da recusa em considerar as opiniões de outros membros da diretoria. Segundo reza a lenda, Mourinho teria dito a Abramovich que 'duvidava' da coragem dele de demití-lo. Hoje, ninguém mais duvida disso.

Depois dele vieram Avram Grant, o amigo do peito, Luiz Felipe Scolari e Guus Hiddink. Todos tiveram o mesmo destino, alguns de forma mais precoce que outros - caso de Felipão. Carlo Ancelotti veio a seguir, e conseguiu, de cara, títulos importantes, o que garantiu a ele uma sobrevida maior. Mas não passou disso. Depois, mais uma sucessão de pequenos reinados: André Villas-Boas, Roberto Di Matteo e Rafael Benítez. E nesse meio tempo o Chelsea não parou de conquistar títulos. Tudo isso disse ao russo que, apesar dele ter ido contra todas as regras do bom senso, tudo o que ele fez deu certo. O mais importante não era um clima de paz e tranquilidade para seus treinadores trabalharem; o mais importante era ter o melhor time.

A cobiçada taça da Champions League, finalmente em Stamford Bridge


Claudio Ranieri, o primeiro técnico de Abramovich no Chelsea, não foi contratação sua. O italiano já estava lá quando o russo aportou em Stamford Bridge. A opinião dele ao ir embora mesmo tendo ficado em segundo lugar, atrás penas do histórico Arsenal que foi campão invicto, era de que 'Roman não entende nada de futebol'. Arnesen concordou, mas só em partes. No começo, ele contou, o russo realmente estava apenas começando a sentir o feeling do negócio e não entendia muito sobre o esporte. Hoje, dez anos depois, ele já sabe exatamente o que quer. E o que ele quer é tudo.

O legado de Abramovich vai muito além de algumas das contratações mais caras do mundo do futebol, das cabeças roladas e dos títulos. Ele também investiu em infraestrutura. Gastou 20 milhões de libras no centro de treinamento de primeira categoria do Chelsea, o Cobham, que também recebe os times juvenis. Muitos talentos nasceram na base do clube nos últimos anos. Mas, por motivos difíceis de compreender, nenhum conseguiu se firmar na equipe principal.

Os gastos em contratações
2003-04: £121.3M
2004-05: £92.2M
2005-06: £54.2M
2006-07: £66M
2007-08: £50.5M
2008-09: £24.2M
2009-10: £21.5M
2010-11: £95.8M
2011-12: £71.5M
2012-13: £86.5M
O motivo, é claro, é o foco. Apesar de compreender que um bom investimento nas categorias de base e nos jovens jogadores pode poupar muitos milhões de libras em transferências, Abramovich optou por uma tática mais agressiva no mercado de forma a transformar o Chelsea em um clube vitorioso e colocá-lo entre os maiores da Europa mais rapidamente. Neste período, foram 11 títulos de grande relevância, que incluem três coroas da Premier League, quatro FA Cups, duas Copas das Liga, uma Liga Europa, além, é, claro, da almejada Champions League de 2012.

Depois de gastar mais de 50 milhões de reais em multas para rescindir contratos de treinadores, Abramovich espera estabilizar o Chelsea sob o comando de Mourinho e começar a aproveitar melhor os frutos das categorias de base. Muito disso se deve à regra de fair play da FIFA, que regula os gastos e os prejuízos dos clubes e já fez uma vítima na Espanha, o Málaga. A contratação de Mourinho, entretanto, inspira certa contradição de interesses, já que o português é famoso por ser gastão. Mal chegou e Abramovich já começou a assinar cheques. O primeiro deles foi pela contratação do alemão André Schurrle, do Bayer Leverkusen, por 18 milhões de libras. O próximo alvo é Edinson Cavani, do Napoli, que não sai da Itália por menos de 60 milhões de euros.

Para tentar equalizar os gastos, o Chelsea tenta se desfazer de vários jogadores que não tiveram o retorno esperado, como Marko Marin e Fernando Torres. Apesar dos gols importantes na reta final da última temporada, o espanhol não convenceu o patrão e, segundo a imprensa britânica, também não inspira simpatia em Mourinho. Depois de muito insistir em ver seus 50 milhões de libras rendendo, parece que Abramovich desistiu de El Niño. Ele inclusive foi oferecido como parte do pagamento por Cavani, mas Aurelio Di Laurentiis, presidente do clube italiano, recusou a proposta. 

As sugestões de que Abramovich estaria se cansando da sua aventura esportiva e em busca de um comprador para o Chelsea parecem mesmo se tratar de uma grande mentira. Depois da conquista do título da Champions League, o presidente do clube, Bill Buck, disse que o discurso dele de agradecimento aos jogadores no vestiário acabou com as seguintes palavras: 'Este é apenas o começo'.

E parece que a próxima década vai começar exatamente como terminou a última: com a mão muito aberta.

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